Cinema História Interminável

História Interminável faz parte dos filmes inesquecíveis para quem cresceu nos anos 80. Muitos vão lembrar-se da canção emblemática do filme, cantada por Limahal, que fazia parte dos vídeos que passavam aos fins de semana nos programas dos tops musicais, onde muitos imaginavam voar nos céus com Falkor... 

Baseado no romance homónimo de Michael Ende, o filme de Wolfgang Peterson conta a aventura fantástica de Bastian em “Fantasia”. Bastian é um rapaz que precisa de amigos e descobre um mundo que precisa de um herói numa terra para além da imaginação. Ameaçado por outros rapazes mais velhos, encontra refúgio numa livraria. O dono dá-lhe um livro mágico no qual ele pode seguir as aventuras de um rapaz que é tudo aquilo que acredita que não é: corajoso, forte e feliz. Bastian mergulha num maravilhoso mundo de fantasia através das páginas de um livro misterioso e começa a aperceber-se que faz parte da história e que a sobrevivência do mundo do qual ele lê a história está, em parte, dependente dele. Um mundo habitado por um caracol de corrida, um morcego planador, o guerreiro Atreyu, uma muito jovem imperatriz, Falkor, um dragão da sorte e uma pedra ambulante. Nos livros tudo é possível mesmo o avanço do “NADA”, que aos poucos está a fazer desaparecer “Fantasia”. Um filme mágico do princípio ao fim.

História Interminável foi feito ainda antes dos realizadores recorrerem a imagens geradas por computador (também conhecidas pela sigla CGI). Assim, as fantásticas criaturas-marionetas que vemos no filme são reais e estavam mesmo no estúdio com os atores. 

O realizador Wolfgang Petersen, falecido em 2022, recorda numa entrevista: "Era o início dos anos 80 e, nessa altura, ainda não tínhamos computadores que pudessem fazer este tipo de criaturas. Tivemos de criar todos estes seres e criaturas, construí-los e animá-los mecanicamente. Por exemplo, o Falkor, o dragão da sorte, é mesmo esta enorme criatura que construímos [cerca de 14 metros]. Na verdade, podíamos tocar-lhe; não era uma animação por computador.

Foram necessárias cerca de quinze pessoas para dar vida a esta criatura, mas todas estavam invisíveis, é claro. Tinham os seus fios para usar, mas estavam escondidas algures por baixo do fato e, por vezes, até debaixo do chão. Havia um pequeno monitor, onde podiam seguir o seu trabalho. Desta forma, havia uma pessoa que estava encarregada dos movimentos do nariz, e havia outras duas encarregadas de cada sobrancelha (...).

Foi preciso muito trabalho para que ele ficasse como está, e acredito que é isso que dá a este filme uma qualidade tão grande que pode ser apreciada, depois de todos estes anos. As criaturas eram muito reais na forma como tinham de interagir com os atores, não era como se estivessem apenas em frente a um ecrã verde e a fingir. Os atores tinham de trabalhar diretamente com as criaturas." (1)

Os efeitos especiais estiveram sob a tutela de Brian Johnson, que começou a sua carreira com Gerry e Sylvia Anderson, nas suas produções com supermarionetas, em Stingray ou Thunderbirds, e mais tarde, Espaço: 1999. Premiado com dois óscares, por Aliens e Star Wars: O Império Contra-Ataca, trabalhou também no filme de Stanley Kubrick, 2001 - Odisseia no Espaço. Colin Arthur foi o criador das marionetas e criaturas singulares de História Interminável. O seu currículo inclui Jasão e os Argonautas ou 2001 - Odisseia no Espaço, quando era um jovem assistente de maquilhagem, e mais tarde, Conan e Clash - Confronto de Titans, para além de ter trabalhado no androide de Alien.

História Interminável ainda é considerado um dos melhores exemplos de efeitos especiais feitos artesanalmente, embora existam sequências em que sentimos que foi feito em outra época, com o seu kitsch de efeitos especiais ultrapassados, o que lhe dá mais encanto.

Uma outra curiosidade, foi o facto de Petersen ter mostrado o filme ao seu amigo, Steven Spielberg, antes de ser lançado nos Estados Unidos, para saber se precisava de um ritmo diferente para o público americano. Petersen seguiu as indicações de Spielberg e fez uma nova montagem com menos 7 minutos do que a versão alemã. Como agradecimento, Petersen ofereceu a Spielberg o medalhão Auryn original, usado no filme.

Uma sessão organizada em parceria com a Cinemateca Júnior que revisita um dos filmes de culto dos anos 80. Quase que podemos dizer que História Interminável foi o Harry Potter de quem cresceu nesses anos, num filme que nos lembra que a esperança e os sonhos não devem morrer, e que ainda há necessidade de fantasia e imaginação neste mundo.

_{(1) Rosy Cordero - The NeverEnding Story oral history: How 3 kids helped save the world. Entertainment Weekly, 18 de dezembro de 2019.}

^{https://ew.com/movies/2019/12/18/the-neverending-story-oral-history/}